22 de abril de 2009

ENSAIO


I
Não se lembra bem
do que estava a fazer,
mas logo depois ouviu.
“Euzébia! Leve a mala ao carro!”
Relutou,
cansada,
exausta,
exaurida de todas as composturas.
Mas antes de contemplar a ordem,
vislumbrou o desenho das nuvens
- um rabisco qualquer
que a ela encheu os olhos;
não, não seria justo
simplesmente voltar ao quarto.
Precisava ficar,
precisava sentir
o fim do dia;
constatar sã
a claridade de todos os tons
salmão-azul-sombrio;
testemunhar o atraso,
e cortar as unhas.

II
Sentou-se na lajota empertigada
da já velha casa.
Olhou para o já conhecido céu.
Pensou.
Pensou nas mais absurdas coisas
que pode alguém supor.
Tantas coisas a dizer que tinha,
e calou – pensava.
Tantas promessas que tinha a cumprir,
e fracassou.
Tanta coisa que tinha pra viver e...
morreu.
Euzébia,
bem ali,
na lajota da já velha casa,
no auge da juventude,
sob os domínios
do já conhecido céu.

III
Morta.
Puseram-lhe, então,
na lápide marmórica
daquele dia 19 primaveril:
“Euzébia,
a menina feita de vento,
que com ele se foi.
A menina de gente,
céu,
cor,
dentre outros sentimentos.
No fim
- disse a mãe ao pai –
ela até levou a mala no carro.”.
Euzébia.
Morta.

IV
Euzébia,
que de lembranças
(coisas que existiram ou não)
vivia
(e viveria)
nas lembranças.
Euzébia. Morta.
Euzébia
que o fim do dia levou,
que amava todos os sóis
toda noite
e tinha essa coisa de ser livre.
Morta.
Euzébia dos amores
e outras dúbias coisas;
amando a praia,
tal como coisas vazias.
Morta.
Aquela mesma,
que das matizes gostava,
que fantasias guardava;
Euzébia dos sonhos que tinha.
Viva em sua própria passárgada:
morta na passárgada
que muito sonhava,
mas sobre a qual ela nada sabia.

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