22 de agosto de 2010

VÍRGULA


Ele me pergunta o que eu tenho. Lembro o quanto, há alguns poucos anos atrás, respondia com orgulho ao ler, ouvir e ver piadinhas até engraçadas sobre nós mulheres termos a mania de dizermos “nada” – com a mesma mentira com que dizíamos não ter comido o bolo antes do almoço. Com orgulho sim. Comentava o quanto considerava errada essa atitude, e que o diálogo é necessário, e esse papo démodé. E as coisas mudam.
Digo que nada. E o que mais eu poderia dizer se tanto já disse e pouco bastou? Adiantou falar, chorar, gritar, pedir, e até xingar? Digo que nada e remôo minha dor, silenciosa, mas intempestiva, pedindo pra explodir. Quando foi que me calei tanto, a ponto de o meu silêncio ser tão pouco notado? Foi porque minha voz perdeu o tom? Foi porque eu desisti? Eu queria que ele ouvisse, e não só que eu falasse. No fundo, eu sei que é bobeira, mas eu queria que ele insistisse. Mas tanto fez.
Depois eu sorri, e brinquei com suas mãos, e o beijei. Mas estava ali ainda. No fim ele me pergunta:
— Me desculpa?
— Não.
— Não?
— Essas coisas têm de ser de coração, não tem?
— Tem. Eu só não entendo porque não pode ser.
— É que não é você. É difícil entender quando não foi a gente que caiu e ralou o joelho.
— Ta bom. Eu vou ta?
— Vai. E por acaso faz diferença?
Ele me beija na testa como um “não”. É nessas horas que dá vontade de dizer: "Desculpa. Não podemos mais continuar com isso", e aí sim virar as costas, ir embora pra sempre, e na próxima esquina ou ruela trocar o coração pelo táxi mais próximo de um mundo novo, ou por um carro zero na garagem. E ponto final. Mas alguma vez é assim? Não com a gente, que tem a espinha dorsal virada pro drama e vê em tudo um amor de vida inteira. Não pra gente que insiste em viver um poema e não um noticiário de investigação criminal do jornal da manhã.Não pra gente que quando sai por aí tenta pisar só nos pedaços brancos da calçada e no susto acaba no terreno obscuro, complexo e desabitado da melancolia dessas coisas - e ainda acha que ta abafando. Nessas horas é que dá vontade de dizer: “Acabou”. Mas a gente da interrogação lá gosta de pontos finais?

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